Pequim quer utilizar JO's para reafirmar a legitimidade política e o orgulho patriótico
A um ano da abertura dos Jogos Olímpicos, que acontecem de 8 a 24 de Agosto, o evento aparece cada vez mais como uma forma de Pequim reafirmar a legitimidade política e o orgulho patriótico de uma China cada vez mais poderosa.
Assim como muitos governos fizeram no passado, desde as Olimpíadas de 1936 em Berlim, passando por Moscovo em 1980 e terminando em Seul em 1988, os jogos do próximo ano servem, dentro e fora dos estádios, para uma afirmação ideológica do Estado chinês e uma demonstração do poder econômico do país.
A confusão entre o espírito olímpico e o espírito político começa no homem que lidera a equipe da organização: com o cabelo preto de risco ao lado e grandes óculos de "fundo de garrafa", Liu Qi, presidente do Comitê Organizador dos Jogos Olímpicos de Pequim (BOCOG, da sigla em inglês), é membro do quadro comunista.
Ex-presidente da Câmara de Pequim, Liu é também o secretário-geral, o número um da organização do Partido Comunista Chinês (PCC) em Pequim e, em discurso no final de junho, já deixou claro que daqui um ano todos os cidadãos devem oferecer uma "imagem civilizada" da capital chinesa.
"O nosso trabalho agora deve se dedicar principalmente a estabelecer uma imagem de país civilizado e divulgar costumes para que os cidadãos sejam bem-vistos", afirmou Liu, pedindo aos cidadãos de Pequim que "abandonem alguns maus costumes, como cuspir e atirar lixo na rua".
"Quatro bilhões de pessoas vão estar de olhos postos na China", disse Liu, se referindo ao público previsto para acompanhar os Jogos Olímpicos pela TV em todo o mundo. "Devemos construir uma boa imagem e mostrar a nossa civilização ao mundo."
Para a cerimônia de abertura das Olimpíadas foi escolhida Zhang Yimou, cineasta e diretor de superproduções baseadas na história chinesa, como "Herói" ou "A maldição da flor dourada".
"Para os chineses, vai ser uma coisa muito, muito importante. Não é só uma cerimônia de abertura dos Jogos Olímpicos, é uma forma de mostrar ao mundo a China e o que está acontecendo agora no país", afirmou recentemente Zhang.
E o que está a acontecer no país é um crescimento econômico superior a 10% desde 1978, que coloca a economia chinesa como a terceira maior do mundo, atrás apenas da norte-americana e da japonesa.Por isso não é de admirar que onde grande parte do mundo vê espírito olímpico, Pequim veja uma corrida, numa espécie de seleção natural contra as outras nações.
Para o BOCOG, qualquer deslize, dentro ou fora do estádio, será um fracasso para a China, para o governo, para o povo e para a civilização chinesa.
"Os Jogos Olímpicos de Pequim são a ocasião perfeita para mostrar em pleno os 5.000 anos de história chinesa e a sua cultura resplandecente", informa o site do comitê na internet, afirmando que os jogos "serão uma ocasião para demonstrar a esplêndida cultura chinesa, a herança histórica e cultural de Pequim e as atitudes positivas dos seus cidadãos".
O objetivo, diz a organização, é "relacionar o passado e o futuro de uma mesma civilização", de uma "nação com uma civilização antiga e uma cultura moderna" e, de forma mais lírica, "como um rio carregando o orgulho da nação, como veia, pulsando com a força da vida".
A China destinou cerca de US$ 200 bilhões (R$ 382,2 bilhões) para a construção de estádios e outras infra-estruturas olímpicas.
Desde a Cidade Proibida à Grande Muralha, as elites políticas chinesas sempre souberam que a arquitetura legitima o poder político, e as Olimpíadas não são exceção.
O Ninho de Andorinha (estádio principal), o Centro de Desportos Aquático e o Centro de Comunicações, entre outros edifícios, foram desenhados pelos arquitetos mais famosos e apresentam as mais recentes tecnologias e os planos mais arrojados para, segundo o BOCOG, "servirem de vitrine às conquistas da mais alta tecnologia da cidade e à sua força inovadora".
Dentro dos estádios, a tentativa de provar no pódio a superioridade da China (e do governo chinês) em relação ao resto do mundo, ao Ocidente e aos Estados Unidos, o principal adversário a ser vencido em conquistas de medalhas, explica também a política do país para alta competição.
O objectivo de toda a organização do desporto de elite chinês é criar uma estrutura para que uma minoria de atletas excepcionais ganhe medalhas de ouro em 2008.
A China, que abraçou a economia de mercado, transfere o aparato do planejamento econômico para a alta competição esportiva.
Descendente directo da organização soviética de desporto de alta competição na década de 1950, o sistema desportivo chinês é totalmente centralizado e dependente do Estado (do governo central e dos governos locais), que se confunde com o PCC e que define objectivos, resultados, formas de treino, equipas e selecções.
Para Pequim, os Jogos Olímpicos vão além das máximas: "o importante é participar" e "mente sã em corpo são", porque os resultados medirão a eficiência do PCC e o número de medalhas legitimará a ordem política chinesa.
A pressão sobre os atletas olímpicos chineses, principalmente por competirem em casa, será extraordinária.
Wu Shaozu, ministro dos Esportes entre 1990 e 2000 não poderia ter sido mais claro quando afirmou que o maior objetivo do esporte chinês é o sucesso nos Jogos Olímpicos. "É onde temos que concentrar os nossos recursos. Içar a bandeira nos Jogos Olímpicos é a nossa maior responsabilidade."
Por Rui Boavida, jornalista "Lusa (Brasil)"
Assim como muitos governos fizeram no passado, desde as Olimpíadas de 1936 em Berlim, passando por Moscovo em 1980 e terminando em Seul em 1988, os jogos do próximo ano servem, dentro e fora dos estádios, para uma afirmação ideológica do Estado chinês e uma demonstração do poder econômico do país.
A confusão entre o espírito olímpico e o espírito político começa no homem que lidera a equipe da organização: com o cabelo preto de risco ao lado e grandes óculos de "fundo de garrafa", Liu Qi, presidente do Comitê Organizador dos Jogos Olímpicos de Pequim (BOCOG, da sigla em inglês), é membro do quadro comunista.
Ex-presidente da Câmara de Pequim, Liu é também o secretário-geral, o número um da organização do Partido Comunista Chinês (PCC) em Pequim e, em discurso no final de junho, já deixou claro que daqui um ano todos os cidadãos devem oferecer uma "imagem civilizada" da capital chinesa.
"O nosso trabalho agora deve se dedicar principalmente a estabelecer uma imagem de país civilizado e divulgar costumes para que os cidadãos sejam bem-vistos", afirmou Liu, pedindo aos cidadãos de Pequim que "abandonem alguns maus costumes, como cuspir e atirar lixo na rua".
"Quatro bilhões de pessoas vão estar de olhos postos na China", disse Liu, se referindo ao público previsto para acompanhar os Jogos Olímpicos pela TV em todo o mundo. "Devemos construir uma boa imagem e mostrar a nossa civilização ao mundo."
Para a cerimônia de abertura das Olimpíadas foi escolhida Zhang Yimou, cineasta e diretor de superproduções baseadas na história chinesa, como "Herói" ou "A maldição da flor dourada".
"Para os chineses, vai ser uma coisa muito, muito importante. Não é só uma cerimônia de abertura dos Jogos Olímpicos, é uma forma de mostrar ao mundo a China e o que está acontecendo agora no país", afirmou recentemente Zhang.
E o que está a acontecer no país é um crescimento econômico superior a 10% desde 1978, que coloca a economia chinesa como a terceira maior do mundo, atrás apenas da norte-americana e da japonesa.Por isso não é de admirar que onde grande parte do mundo vê espírito olímpico, Pequim veja uma corrida, numa espécie de seleção natural contra as outras nações.
Para o BOCOG, qualquer deslize, dentro ou fora do estádio, será um fracasso para a China, para o governo, para o povo e para a civilização chinesa.
"Os Jogos Olímpicos de Pequim são a ocasião perfeita para mostrar em pleno os 5.000 anos de história chinesa e a sua cultura resplandecente", informa o site do comitê na internet, afirmando que os jogos "serão uma ocasião para demonstrar a esplêndida cultura chinesa, a herança histórica e cultural de Pequim e as atitudes positivas dos seus cidadãos".
O objetivo, diz a organização, é "relacionar o passado e o futuro de uma mesma civilização", de uma "nação com uma civilização antiga e uma cultura moderna" e, de forma mais lírica, "como um rio carregando o orgulho da nação, como veia, pulsando com a força da vida".
A China destinou cerca de US$ 200 bilhões (R$ 382,2 bilhões) para a construção de estádios e outras infra-estruturas olímpicas.
Desde a Cidade Proibida à Grande Muralha, as elites políticas chinesas sempre souberam que a arquitetura legitima o poder político, e as Olimpíadas não são exceção.
O Ninho de Andorinha (estádio principal), o Centro de Desportos Aquático e o Centro de Comunicações, entre outros edifícios, foram desenhados pelos arquitetos mais famosos e apresentam as mais recentes tecnologias e os planos mais arrojados para, segundo o BOCOG, "servirem de vitrine às conquistas da mais alta tecnologia da cidade e à sua força inovadora".
Dentro dos estádios, a tentativa de provar no pódio a superioridade da China (e do governo chinês) em relação ao resto do mundo, ao Ocidente e aos Estados Unidos, o principal adversário a ser vencido em conquistas de medalhas, explica também a política do país para alta competição.
O objectivo de toda a organização do desporto de elite chinês é criar uma estrutura para que uma minoria de atletas excepcionais ganhe medalhas de ouro em 2008.
A China, que abraçou a economia de mercado, transfere o aparato do planejamento econômico para a alta competição esportiva.
Descendente directo da organização soviética de desporto de alta competição na década de 1950, o sistema desportivo chinês é totalmente centralizado e dependente do Estado (do governo central e dos governos locais), que se confunde com o PCC e que define objectivos, resultados, formas de treino, equipas e selecções.
Para Pequim, os Jogos Olímpicos vão além das máximas: "o importante é participar" e "mente sã em corpo são", porque os resultados medirão a eficiência do PCC e o número de medalhas legitimará a ordem política chinesa.
A pressão sobre os atletas olímpicos chineses, principalmente por competirem em casa, será extraordinária.
Wu Shaozu, ministro dos Esportes entre 1990 e 2000 não poderia ter sido mais claro quando afirmou que o maior objetivo do esporte chinês é o sucesso nos Jogos Olímpicos. "É onde temos que concentrar os nossos recursos. Içar a bandeira nos Jogos Olímpicos é a nossa maior responsabilidade."
Por Rui Boavida, jornalista "Lusa (Brasil)"
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